Embora não tenha disposições específicas, porém por meio do uso da interpretação de suas normas o Código de Defesa do Consumidor é plenamente aplicável a essa modalidade de relação de consumo, confira abaixo alguns direitos.
Publicado por Felipe Pacheco Cavalcanti
1. Impossibilidade de cobrança de multa por perda da comanda
Alguns bares e restaurantes utilizam sistema de comandas/fichas individuais para controlar o consumo dentro do estabelecimento. Não é raro constar no verso da comanda frases com menção ao pagamento de multa na hipótese de extravio ou perda da comanda, esses valores passam da casa das centenas, muito embora a comanda/ficha seja um mero pedaço de plástico sem valor. Do ponto de vista do comerciante, o que se busca evitar é que pessoas consumam e percam a comanda na tentativa de pagar menos do que consumiu. Contudo, esse tipo de cobrança é contrário ao Código de Defesa do Consumidor.
Em primeiro lugar, o ônus da atividade do empresário deve ser arcado por ele próprio. Assim, não pode ser transferido para o consumidor o risco do negócio, cabe ao estabelecimento adotar um sistema de cobrança que permita a conferência dos valores consumidos independentemente de o consumidor portar ou não a referida ficha.
Segundo, se o estabelecimento sofreu algum dano em decorrência do extravio da comanda, esse dano precisa ser quantificado e especificado, uma vez que o artigo944 do Código Civil diz que a indenização é medida pelo dano causado, sendo assim o bar ou restaurante só pode exigir do consumidor o que de fato ele consumiu. Se o estabelecimento exigir além do que foi consumido sua conduta será considerada abusiva, nos moldes do artigo 39, V, do Código de Defesa do Consumidor. Caso o consumidor tenha pago essa multa poderá exigir o reembolso em dobro da quantia paga indevidamente, conforme artigo 42 do CDC.
2. Pagamento opcional de gorjeta de 10% ao garçom
Alguns Estados brasileiros possuem normas específicas que tratam da matéria, porém mesmo que não houvesse uma disciplina específica o Código de Defesa do Consumidor traz dispositivos aplicáveis. De início, é preciso registrar que a cobrança de 10% não pode ser feita embutido no valor total, deve o estabelecimento fazer um cálculo à parte do valor correspondente, sendo necessário que o consumidor seja informado sobre o caráter opcional do pagamento, consoante o disposto no artigo 6º, inciso III, do CDC.
Conforme já foi dito acima, a custo da atividade empresarial não pode ser arcada pelo consumidor, isto é, o custo decorrente da remuneração do garçom deve ser de inteira responsabilidade do bar ou restaurante. O consumidor quando dá a gorjeta o faz por mera liberalidade, é uma retribuição pela cortesia e bom atendimento recebido naquele estabelecimento. O Código de Defesa do Consumidor veda que o fornecedor de produtos ou serviços exija vantagens excessiva, ou seja, não pode ser exigido que o cliente pague obrigatoriamente a gorjeta, sob pena de violação do artigo 39, inciso V. Por fim, o valor pago não necessariamente deve corresponder a 10% do valor da conta, uma vez que por se tratar de uma faculdade do cliente, ele pode optar por pagar menos ou mais do que isso.
3. Direito de ser informado sobre a cobrança de Couvert
Há dois tipos de couvert: o artístico e o gourmet. O primeiro deles consiste na cobrança pela música ou qualquer evento ao vivo que esteja sendo apresentado no estabelecimento. Já o segundo diz respeito aos alimentos servidos em pequenas porções antes da chegado do prato principal. Ambos são permitidos por lei, sendo que o couvert gourmet é facultativo, enquanto que o couvert artístico é obrigatório.
Em ambos os casos, o que não é permitido é que a cobrança seja feita sem que antes o consumidor seja devidamente avisado, tendo em vista que a relação de consumo é pautada em princípios de transparência e informação. Além do mais, é vedado o fornecimento de qualquer produto ou serviço sem que haja prévia solicitação do consumidor, conforme a regra contida no artigo 39, inciso III, do CDC.
Sendo assim, é necessário que o bar ou restaurante informe, preferencialmente na entrada, que o estabelecimento cobra pelo couvert para que o consumidor decida se entrará ou não. Caso o consumidor não seja informado sobre a cobrança, ele poderá se recusar ao pagamento, com fundamento no art. 39, parágrafo único, do CDC.
4. Vedação ao uso de forno micro-ondas ou elétrico para reaquecer os alimentos
É usual que alguns estabelecimentos utilizem o forno micro-ondas ou elétrico para reaquecer os alimentos que estão expostos à venda. Antes que cause estranheza, é preciso esclarecer que não é vedado o uso desses aparelhos na cozinha, mas, na verdade, o que é vedado é o uso de forma indevida.
Os alimentos que já foram cozidos, ao serem expostos para a venda, devem estar em condições de temperatura que evitem a proliferação de micróbios, ou seja, devem ser acondicionados em estufas térmicas ou aparelho similar que garanta temperatura elevada.
Assim sendo, não pode o estabelecimento preparar o alimento e deixa-lo em temperatura ambiente para somente esquentá-lo quando o cliente for consumi-lo, conforme determinado pela Resolução da ANVISA RDC nº 216/2004, em seu item 4.8.15, os alimentos vendidos quentes devem ser armazenados em temperatura superior a 60ºC. Portanto, todo e qualquer alimento que seja vendido quente deve estar em condições de ambiente e temperatura adequado.
5. Os funcionários que manuseiam dinheiro não podem manusear alimentos
Embora seja óbvio que essa conduta seja proibida, é corriqueiro que os funcionários do estabelecimento manipulem em dinheiro e sirvam os clientes, a exemplo do garçom que ao final traz a conta para pagamento. Essa conduta é proibida, devida a enorme possibilidade de contaminação dos alimentos com micróbios oriundos das cédulas. A Resolução da ANVISA RDC nº 216/2004, em seu item 4.10.7, veda essa prática, independente dos alimentos vendidos serem embalado ou não, pois a norma exige que o recebimento de valores seja realizado por pessoas diferentes. Não se trata de um mero capricho, mas de uma norma importantíssima para a saúde dos consumidores.
Autor: Felipe Pacheco Cavalcanti
Originalmente publicado em: Blog PachecoCavalcanti
Felipe Pacheco Cavalcanti
Advogado com atuação na área Cível e Previdenciária. Graduado pela Associação Caruaruense de Ensino Superior – ASCES (2015). Pós-graduando pela Faculdade Damásio. Site profissional: www.pachecocavalcanti.adv.br Currículo Lattes CNPQ: http://lattes.cnpq.br/5223232390927412